Sunday 28 February 2010

Os sons da nossa cabeça

Ele foi uma das pessoas influentes na minha vida e na forma como me mostrou o outro lado, o pensamento e o respeito pelo outro. Ensinou-me, sem a inevitável atitude paternalista, muito sobre as relações humanas. E ainda me deixou entrar numa nesga do seu mundo fechado, isolado em muralhas invisíveis. Que sorte ter tido acesso a isso. Um dia, em conversa, contou-me que, anos depois de regressar da guerra - para onde foi voluntário - continuava a sentir o peito acelerar ao som dum helicóptero. Só descansava quando o via, explicou-me. O meu som, inexplicável, que me faz saltar da cadeira muitos anos depois é um determinado acelerar de motor. Vindo de outras guerras, é certo, mas entranhado da mesma forma.

Friday 26 February 2010

Sintomático

... é o facto da minha discussão do dia com o meu chefe ser por ele achar que eu não posso considerar a nomeação do Constâncio para o BCE o premiar da incompetência. Não posso? Posso e devo. Aliás, devemos todos, se formos coerentes.
- Ah e tal ele falhou só nalgumas coisas e tens que ver que houve bancos que faliram em Inglaterra e cá não.
Meus amigos, ele era pago de forma principesca para supervisionar. Não o fez. Ponto. Aliás, como foi tornado público, ignorou avisos. Mais, não investigou quando o Jardim Gonçalves, que devia estar preso, andou a "emprestar" dinheiro ao filho. E é obviamente desonesto do ponto de vista intelectual, tendo em conta que passou o mandato a fazer "bicos" ao Sócrates e a afirmar em praça pública, mesmo contra a evidência dos números, o que dava jeito ao "chefe". E calma, cá os bancos não faliram porque estamos todos a pagar os buracos!
Sintomático é o facto disto me indignar e de, de repente, ouvir a voz de indignação do meu colega. Apurado o ouvido percebo a indignação dele, agarrado ao telemóvel. É que é mesmo inadmissível a forma como o Record tem tratado o Carvalhal em particular e o Sporting em geral.
Suponho que cada um se indigna com o que quer!

Saudade

Hoje, por breves instantes, passei numa cidade extraordinária. Que saudade do tempo em que a inocência, a vontade de tragar o mundo e o divertimento estavam sempre de mãos dadas.
Hoje era a noite dos estudantes e noite especial de saída até muito muito tarde. E eles andavam pelas ruas, de traje, de música e de muito álcool a tiracolo.
Ah, que saudade. Dizem que amor de estudante não dura mais de uma hora; só o meu é tão velhinho, qu'inda se não foi embora. (ler trauteado com a música adequada).
:)

Wednesday 24 February 2010

O Bom, o Mau e... o jornalista

Já me tinham falado no Victor, que tem 9 anos e andava, entre destroços, à procura do mealheiro, com 129 euros, para ajudar o pai a reconstruir a casa que a ribeira levou... e o facto de me terem falado nisto é por si só sintomático de que o trabalho do jornalista foi bem feito - informou e deixou a mensagem nas pessoas. E, face a tanta "informação" sobre a tragédia, conseguir que os telespectadores fixem uma determinada notícia é um feito. Vi-a há pouco. E sim, Pedro Coelho vai buscar à cartilha o mais básico (e, neste caso, bem feito), do jornalismo: contar uma história. Tornar as pessoas reais. O Victor não tem mais tragédia do que outros madeirenses, nem mais prejuízo, nem nada que o particularize. Mas é um miúdo o que, por si só, comove. E depois, ao contar-nos essa banalidade e impossibilidade aparente, Pedro Coelho muda tudo. O Victor passa a ter nome, rosto e, mais que tudo, passa a ser o nosso vizinho, o primo, o irmão. O Victor é um de nós e perdeu tudo e isso é muito mais do que números de mortos. Isso é jornalismo eficaz.
PS - O jornalista, diz a definição, é o tipo que corre para o sítio de onde todos os outros estão a fugir.

Ilhéus

Não tenho nada contra a insularidade - já fui bem feliz em várias ilhas - mas devo dizer que há aqui alguma coisa estranha. Que me lembre só os regimes autocráticos escondem o número de mortos e apresentam versões diferentes daquelas que toda a gente conhece.
Não é aceitável ignorar a descoberta de mais mortos, como não é credível pensar que não morreu gente dentro dos carros nos parques subterrâneos.
Jardim, se pudesse, calava os jornalistas e transformava-os em pés de microfone. Assim, tenta só criar novos factos.
Há uma outra ilha onde os factos são criados a bel-prazer do Estado, os números oficiais não são verdadeiros e o turismo é a grande força económica. Também é gerida por um regime ditatorial. Além vê as parecenças, ou sou só eu?

Friday 19 February 2010

O desfocado

Podia tecer considerandos sobre o administrador da PT que tentou impedir um jornal de ser publicado. Mas não vale a pena. Leia-se o que a Visão escreveu sobre ele. E percebe-se que a sua maior qualidade profissional é saber agarrar e abanar a bandeira certa. A cor de rosa, no caso. É extraordinária a sua ascensão "profissional". O boy típico, sem tirar nem pôr. Gosto do toque de se ter despedido. Mas calma, não tenhamos pena. Despediu-se, apenas, da administração. Continuará a trabalhar na PT, empresa que já foi pública e "engordou" durante muitos anos à custa de todos nós e da falta de concorrência. Era bom que alguém lhe explicasse que tentar impedir um jornal de ser publicado é um atentado à liberdade de imprensa. E revela completa falta de espírito democrático. Se fosse tudo mentira (o que nesta altura já ninguém, a não ser o PGR, acredita), o visado teria vários instrumentos em seu poder: tribunais em última instância e lei de imprensa, para desmentidos e reposição da verdade. Será de mim ou a PT começa a aparecer muito chamuscada nesta caldeirada?

Vamos fazer uma petição...

ou mesmo uma colecta. E vamos fazê-la já! É que face a estas declarações, Pinto Monteiro precisa mesmo que alguém lhe ofereça uma Constituição da República. Aliás, bastar-lhe-ia ler alguns dos primeiros artigos.
Ah, e talvez algum professor de Direito se chegue à frente para umas aulas particulares sobre o que é um Estado de Direito.
Mas a ver se isso acontece rapidamente, antes de ouvirmos mais alarvidades.

Submissão


Sou acusada de ser feminista e refilona. Desde que me lembro de ser gente. Bato-me todos os dias pela igualdade de géneros. Nunca hei-de conseguir explicar o fascínio que o tango, uma dança de sedução - mas também de submissão - exerce sobre mim. Na foto Juan y Graciana. Fantásticos!
PS - Um som de encher a alma.

Thursday 18 February 2010

Confusões


A falta de conhecimento e de cultura democrática neste País chega a ser deprimente. A qualquer momento estamos a atirar com um "isto está pior do que antigamente e já não se pode dizer nada e querem calar a comunicação social". Meus amigos, qual comunicação social? Vamos ser honestos, a comunicação social, livre e independente, em Portugal (falo só do que conheço) não existe. Gosto de os ver no Parlamento a discutir a liberdade de imprensa e a ouvirem o Zé Manel Fernandes, a Manela e o Mário Crespo. E apenas digo, com o devido respeito, que não é aí que se vê se a imprensa é ou não livre. Não podemos falar de liberdade de imprensa num País que permite que os jornalistas sejam explorados e que manda embora quem sabe e tem memória e contrata estagiários bem intencionados mas impreparados, sem memória, sem cultura, sem conhecimento. Não peçam liberdade de imprensa se todos os dias há menos jornalistas a escrever. Estarei a ser exagerada? Talvez, mas ganhar o salário mínimo ao fim de 10 anos de trabalho dedicado (tantas, tantas horas, tantas madrugadas) fazem com que as pessoas não se esforcem, percam a capacidade de se interrogar, de continuar a escrever. A definição da agenda - quem decide afinal que eventos cobrir - a orientação política dos media, que em Portugal não é assumida e as condições de trabalho das pessoas não podem ser assuntos arredados da discussão da liberdade de imprensa. Muitas vezes quem está a desempenhar funções de jornalista nem sabe, nem se questiona porque é que faz um trabalho e não outro qualquer. Depois, no afã de discutir a liberdade de imprensa esquecemo-nos que existem empresas de comunicação social. Que é suposto darem lucro. Permitimos que os jornais locais, por exemplo, vivam num precário equilíbrio a que não são alheias as "publicidades dos municípios". Pernicioso, para não dizer pior. Os jornalistas são o pior exemplo - porque poucas vezes denunciam o que se passa dentro de "casa". Não ver que os jornais e as televisões e todos os outros são empresas e têm de dar lucro é um erro. Seria tudo mais transparente se não nos esquecessemos disso. Não estou a discutir sobre as pressões feitas (ou não) sobre os supra-citados. Nem me custa a acreditar que tenham existido, tendo em conta o lodo em que se move a política nacional. Mas a liberdade de imprensa (ou a falta dela) não é na discutível crónica do Mário Crespo. Aliás, lembre-se, uma crónica é um artigo de opinião, não é informação. O PM não tem, como é óbvio, estatura moral para lidar com imprensa livre e esclarecida. Apenas lamento que se esteja a discutir pelo lado errado. Quanto à tentativa de controlo dos media recordo que em Portugal temos duas agências noticiosa. Uma é uma empresa do Estado, cujos critérios editoriais são, no mínimo, discutíveis. A outra é da Igreja. Sócrates tinha um plano para controlar a comunicação social? Nem sei se isso seria necessário. Ainda assim, por muito menos, já se demitiram ou destituiram governos. É um cenário efabulado. Para se demitir o PM teria de ter vergonha na cara (ou um plano para voltar ao poder, ou um bom tacho fora do País). Para que fosse destituído, o Cavaco teria de ter espinha dorsal. Mas também ele tem a sua própria agenda - a reeleição. Por isso, continua a nunca falar quando é preciso e a tentar passar por entre os pingos da chuva. Só o próprio é que não vê que está molhado até aos ossos.

Thursday 11 February 2010

Heróis

Eu era muito pequena. Mas lembro-me bem de ouvir na televisão a história dele. E de ficar chocada quando me explicaram, de forma simplista, que ele estava preso sem ter cometido crimes. Só porque na terra dele havia, por exemplo, autocarros para brancos e outros para pretos. E ele não concordava, explicaram-me. E ele era contra quem mandava, tinha outras opiniões, disseram-me. E eu, que era pequena, e creio que nunca tinha convivido com qualquer preto - tão só porque eles não existiam no meu mundo, uma pequena cidade do litoral, nos anos 80, sabia que tudo isso estava errado. Porque para mim não havia isso de sermos melhores ou piores por termos uma pele diferente. E, mais do que uma consciência anti-racista, o que eu sabia bem é que ninguém, em sítio nenhum do mundo pode ser preso por causa das suas opiniões. Logo eu, que sempre tive opinião sobre todas as coisas. Eu era pequena e não tinha como saber o alcance daquele homem. Mas sei bem como me marcou a sua história. Lembro-me muito bem de o ver um dia, na televisão, a deixar a cadeia onde esteve 27 anos. Há 20 anos eu era uma criança. Acho que ele foi um dos responsáveis pelo despertar de uma consciência cívica e política em mim.

In spite of all the damage

Um dos problemas de se ser disfuncional é ouvir incontáveis vezes a mesma música.
Acho que isto seria bom para ouvir ao fim da tarde, a fumar um cigarro. Ou a fazer tarte de mirtilos, acompanhada de chá de menta.
Ou mesmo good old fashion sex. À frente da lareira, em movimentos lentos.
Ok. Demasiados filmes.
Claramente não será a banda sonora duma quinta-feira cheia de trabalho. Mas, so far so good.
:)

Wednesday 10 February 2010

Ouvir

Às vezes ouvimos coisas que nos enchem a alma.
Hoje The be good Tanyas.

P.S. In spite of all the damage on repeat.

Thursday 4 February 2010

Pluralidades

Foi com estupefacção que ouvi hoje que existem alunos portugueses que têm processos no Diap. Podia tratar-se de um caso de violência sobre os professores - como conhecemos vários. Ou de bulling entre colegas. Ou de miúdos violentos que roubam e esfaqueiam nos pátios das escolas perante um certo encolher de ombros do sistema, que os passa de ano, sem que tenham qualquer tipo de conhecimentos.
Afinal, não! Os alunos do ensino secundário têm processos no Diap porque se manifestaram.
E as manifestações parece que são coisas perigosas. Veja-se que haja a extrema necessidade de chamar a polícia para "policiar" - passe o pleunasmo - os feirantes dos carrosséis, para que não se manifestem. Engraçado como para isso ainda não houve falta de efectivos. Só para nos proteger, para fazer rondas de patrulhamento ao pé das nossas casas e das escolas dos nossos filhos é que faltam agentes.
Esses sacanas dos alunos e dos feirantes e de todos quantos se manifestam - deviam estar todos presos!Os enfermeiros, os professores e toda uma cambada...Presos! Agora a manifestarem-se, tss,tss, tss...

Acabo de conhecer detalhes das indicações editoriais de um dos jornais nacionais. A jornalista acompanhou uma visita do primeiro-ministro - estavam pessoas a vaiá-lo. Escreveu sobre isso. Ligaram a perguntar se não havia também gente a aplaudir... E mudaram-lhe o texto.

A liberdade de expressão e, consequentemente, de imprensa, é a primeira das liberdades. Estamos a deixar que a roubem e não nos ocorre fazer nada.